domingo, janeiro 01, 2017

Stepan Bandera: líder, marido e pai

Stepan Bandera, o fundador e líder da ala revolucionária da Organização dos Nacionalistas Ucranianos (OUN-R) que dedicou toda a sua vida à causa da independência da Ucrânia e foi assassinado pelo KGB na Alemanha Federal em 1959 (usando uma arma química binária), é pouco conhecido na sua vertente pessoal e humana. O texto de hoje tentará fechar essa lacuna.
O padre Andriy Bandera em frente e o jovem Bandera no 2º plano, único sem a camisa 
Bandera, nascido em 1 de janeiro de 1909 era o 2º filho de uma família de 3 irmãos e 3 irmãs. A maioria dos seus familiares morreu, vítimas dos inimigos políticos da Ucrânia. Em 1941 NKVD fuzilou o seu pai, padre grego-católico Andriy Bandera. Os seus irmãos Oleksandr e Vasyl morreram no campo de concentração nazi de Auschwitz. Irmão Bohdan morreu às mãos dos soviéticos em 1944, um cunhado morreu em Lviv na cadeia do NKVD. A sua sogra, Yulia Hankivska foi assassinada pelos nacionalistas polacos da Armia Krajowa. As irmãs Volodymyra e Oksana passaram 45 anos na Sibéria...

Amigo dos seus amigos

“Não era alto, cerca de 166-167 cm, o rosto ligeiramente oval, fresco, a testa semi-calva. Largo no peito e ombros. Olhando com mais atenção para o seu andar, podia-se notar que coxeava ligeiramente no pé direito. De preferência vestia as roupas modestas de cor cinzenta, não se diferia dos companheiros. Usava um chapéu cinzento-escuro, costumava usar a boina preta, à francesa”, – descrevia a aparência de Stepan Bandera após a II G.M. o chefe de inteligência da OUN, Stepan Mudryk.

Os seus amigos e colegas dos anos no ginásio de Striy (1919-1927) e, depois na Faculdade de Agronomia do Politécnico de Lviv (1928-1934) recordavam o seu humor, honestidade, moderação e o sentimento de superioridade moral em relação às pessoas que considerava “apolíticas”. Os descrevia com desprezo: “Gente analfabeta! Não sabe nem ler, nem escrever”. Costumava ficar ofendido com amigos que ajudavam às pessoas assim.

O ativista da OUN, Gryhory Melnyk recorda o caso, em que Bandera, na altura estudante do Politécnico de Lviv, publicamente se recusou à apertar a mão de um estudante do direito que anteriormente tinha declarado: “Não me meto na política. Sou estudante ucraniano e é tudo!”

Já com os amigos Bandera sempre era cordial, compartilhava tudo, gostava de brincar. Tinha um bom sentido do humor. Nas discussões usava as piadas relevantes, algumas citações das Escrituras, expressões da filosofia popular ou da literatura ucraniana, principalmente da poesia... Imitava as maneiras de falar dos seus amigos, tinha boa memória e fazia longas citações, misturadas com uma grande dose de humor. Na época de escuteiro, gostava de fingir ser Mahatma Gandhi. Se vestia imitando um hindu, subia à árvore e de lá, com grande fervor, usando expressões faciais e gestos exóticos, proferia um discurso “indiano”... Os amigos batiam as palmas e soltavam as gargalhadas.

Já quando as questões eram organizacionais, Bandera era muito sério e profissional. O historiador e um dos líderes da OUN, Petró Mirchuk, recorda o seu estilo de liderança: “Em todas as reuniões da Organização, Bandera chamava a atenção à eficiência, não gostava de discursos vazios e desvios do tema em discussão, terminando a reunião com a decisão final em determinada matéria e a escolha dos responsáveis ​​pela implementação daquela decisão. Expressava a sua opinião por último, após falarem todos os outros membros da liderança da Organização, antes da discussão. Sempre defendia a sua opinião nos debates, mas perdia na votação final, respeitava a decisão vencedora como a obrigatória.

Mas quando as conversas organizacionais terminavam, tornava-se alegre, falante, brincalhão e adorava quando seus interlocutores também se descontraíam. Com agrado escutava as histórias engraçadas, contadas pelos amigos. Talvez essas qualidades o levaram à colaborar no jornal humorístico mensal “Orgulho da Nação” (1928-1930), onde escrevia com o pseudónimo de Matviy Pardon.

Bandera não gostava de servilismo e tratava honradamente os seus críticos. Petró Mirchuk lembra que quando alguém o elogiava, Bandera perguntava: “O que ele quer de mim? Eu quero saber a verdade sobre cada caso, e esta é melhor exposta pelo crítico corajoso”.

Bandera estudante

Os estudos não lhe eram fáceis, especialmente a língua e história polaca, grego e latim. Na certidão do ginásio que terminou em 27 de maio de 1927, os resultados finais eram os seguintes: língua e história polaca – satisfaz; alemão, latim, grego, ciências, a educação física – bom; a língua rutena (ucraniana), a religião, matemática, física, química, propedêutica – muito bom.

Stepan Bandera não terminou o Politécnico de Lviv, pois foi condenado à prisão perpétua pela organização, em 1934, da liquidação do ministro do interior polaco, Bronisław Pieracki.
   
Após a sua libertação da prisão em 1939 continuou aprendendo e exigia o mesmo dos amigos. Recorda Stepan Mudryk: “Lia muito, especialmente os livros de história, memórias de políticos, incluindo estrangeiros – polacos e alemães. Escreveu muito claramente. Se interessava pela tecnologia, lendo revistas técnicas. Durante a conversa nunca interrompia o interlocutor, escutava tudo. Quando alguém exponha os seus planos, então pedia que argumentasse, apresentasse os exemplos. Era muito discreto, nunca dizia de quem ouvia determinada informação. Falava de forma muito clara e convincente, não se repetia. Era muito esforçado e exigia o mesmo de todos os que com ele colaboravam”.

Desportista
Com os colegas da OUN nos Alpes, 2º à direita
Não chegou aos quaisquer sucessos significativos no desporto, ao contrário do comandante do Exército Insurgente Ucraniano (UPA), Roman Shukhevych. Sofria de dores reumáticas nos joelhos. No entanto praticou a corrida, natação, esqui, basquetebol, peregrinação. Nos tempos livres jogava xadrez, cantou no coro e tocava violão e bandolim.
O jovem Bandera no tempo do escuteiro, década 1920
Era membro das organizações desportivas Sokił e Plast. Em 26 de fevereiro de 1923, fazendo o exame de admissão ao “Plast” e preenchendo a sua fixa, na coluna de “poupança” escreveu: “com o dinheiro economizado comprei a uniforme do Plast e o bandolim”. Bandera não fumarava, não bebia álcool, regularmente fazia exercícios físicos, incluindo na prisão. Amava a natureza, fazia as caminhadas nas montanhas, no inverno, muitas vezes praticava o esqui.

Vivendo na Alemanha, após a II G.M. Bandera se apaixonou pelo futebol, torcendo pelo “Munich 1860” e, muitas vezes assistiu os seus jogos em casa. Mas o seu maior hobby era a fotografia. Ele até organizou um laboratório nas instalações da OUN em Munique. Graças à esta paixão foram preservados muitos momentos do Bandera no seio da sua família.

Marido e pai

No dia 3 de junho de 1940 Stepan Bandera se casou na cidade de Cracóvia com Yaroslava Oparivska (1917-1977), a filha do padre da igreja greco-católica ucraniana, Vasyl Oparivsky. Era um casamento muito simples, com cerca de 10 convidados. Algum tempo depois, o casal se mudou para a Varsóvia, onde vivia de forma muito modesta, usando o apelido Hutsul.
O casal Bandera (à direita) com amigos e filhos
As mulheres não eram a paixão do líder da OUN, diferentemente dos dois principais comandantes da UPA – Roman Shukhevych e Vasyl Kuk. Bandera era um homem de família exemplar. Ele gostava de ir ao mercado para fazer as compras, ajudava a sua esposa no trabalho doméstico. Slava Stetsko, a esposa do Yaroslav Stetsko que conhecia bem a família Bandera (eram as famílias amigas), recordava: “Ele era [uma  pessoa] muito familiar. Era o seu maior traço... Ele podia tudo. Lidar na cozinha, arranjar a viatura ou a luz, podia lidar com fonógrafo, e, aparentemente, usava uma máquina de escrever”.   
O membro sénior da OUN Mykola Klymyshyn (1909-2003), Lecia, Steman e Andriy Bandera

Amava muito as filhas Natália (1941-1985) e Lecia Bandera (1947-2011), o filho Andriy (1944-1984). Tentou dedicar lhes cada momento livre o que é visível nas fotografias. Slava Stetsko recorda que, graças ao pai, a sua filha Lesia aos dois anos já andava de esqui e nadava. O casal Bandera educava as suas crianças no espírito religioso e nacional, incutia lhes o amor pelo desporto. A filha mais velha – Natalia pertencia ao “Plast”, Andriy e Lesia muitas vezes iam para os campos da Associação Juvenil Ucraniano (CYM). Bandera repetidamente pedia aos educadores para que não distinguissem os seus filhos de outras crianças.
Stepan Bandera com filho Andriy e filha Lecia
Amigos recordam que ele sempre reclamava a impossibilidade de dedicar à família o tempo suficiente, por isso quando podia organizava os passeios familiares, piqueniques, natação em lagos, jogos divertidos. Slava Stetsko recorda que Yaroslava Bandera realmente ria, apenas sorria, sentindo receio e preocupação permanentemente pelo marido e filhos. Mesmo assim, ela nunca se queixou do seu destino.
Bandera com a sua esposa Yaroslava
Trechos do livro: “A vida e obra de Stepan Bandera: documentos e materiais”, 3ª  edição complementada. Editor e compilador Mykola Posivnych, Ternopil, 2011.

1 comentário:

Anónimo disse...

Não somente os fascistas húngaros, chauvinistas poloneses, nazis e soviéticos falaram besteiras e mentiras sobre Stepan. Alguns ucranianos também assumiram vergonhosamente esse papel. Os capangas do Andriy Melnyk acusaram que o Bandera era comunista (sic!) e o OUN-B uma organização bolchevique (sic!). Ainda bem que no final da vida o Melnyk se arrependeu e se reconciliou com o batko, mas na época da divisão do OUN, os melnykistas condenaram o Bandera à morte.